03 abril, 2010

Guerreando de estilingue nesta luta desigual

Tudo começou em 1997. Marcio adentrou à sala de oitava série, alunos e alunas permeados pelo pensamento conservador, machista, reacionário; que louvavam estarem dentro de um quadrado com carteiras enfileiradas, devendo obediência ao Amado-mestre, visão quase divina, daquele que "ministrava conhecimento":

- Dom Pedro foi um filho da puta! E Dom João VI não passava de um porco, comedor de coxinhas!!!

Chocados, alguns estudantes decidiram se retirarem da sala. Optei por ficar... e continuou:

- Jesus, para mim, foi um grande libertador! Mas, jamais curvarei meu lombo carcomido a Ele. E a qualquer outro ser humano.

Tais argumentações descontruiam tudo aquilo que havia aprendido em casa, na escola ou com meus avós na Vila Hortência. O caos se instalava em minha mente... Marcio era professor de história, daqueles que piravam (ou salvavam) os alunos.

Éramos a geração do "lixo musical": ralávamos na boquinha da garrafa, apoiávamos o bonde do tigrão e entendíamos Mamonas Assassinas como a maior expressão de rebeldia. Geração intermediária da Abertura Democrática e à Ditadura Militar, aprendemos com os nossos pais que Cazuza era uma bicha-louca drogada. E Marcio dizia:

- Meus heróis morreram de overdose; os meus inimigos estão no poder!

Era a ideologia que nos faltava, que muitos de nós renegava. A geração do conformismo, do "se dei bem (sic) ", sendo posta à prova por um professor que navegava contra a corrente de um dos colégios mais caros de minha cidade, notadamente visto como colégio de elite. Pais foram ao colégio reclamar do "professor-louco" que estava contaminando e estimulando à rebeldia de seus filhos.

Decidi que ia prestar atenção nele, passei a ouvir Racionais e Chico Buarque. Li "O que é isso, Companheiro e Lamarca, o Capitão da Guerrilha" e embarquei no caminho doloroso, triste e sem volta, do conhecimento crítico. Meus pais redobraram a atenção. A priori, tornei-me um "chato de galocha", afastei-me de corpo-presente da sociedade; não alcançava mais sentido os assuntos cotidianos.

Ao me aproximar dos 30 anos, tendo quase a idade do professor quando me deu aula, compreendo-o.

Não á fácil fazer a opção de se despregar da Matrix (e, ingenuamente, entrar em outra), perceber que a turma dos "vinte e pouco" de agora, assim como a minha, enxerga o ato de protestar em festas rave, em reggae (onde não se compreende a origem do movimento ou mesmo a tradução da letra que se propaga) ou transando sem camisinha, adeptos da dialética malandro-borboleta do "lavô, tá novo".

Costumo conceituá-los como a "Geração Samba-Rock":

"Tô namorando aquela mina, mas não sei se ela me namora..."

O poeta "Seo" Jorge. Um reacionário, nos moldes "rebeldes" da juventude atual, propaga a retórica do senso comum e é seguido por muitos:

- Burguesinha, burguesinha, burguesinha... Só filet!!!

Só filet?!?!?! No único momento rompedor de sua vasta poesia... FILET!!! Pelamor!!!

Portanto, submeto-me a um novo caos intelectual: como é duro resgatar o discurso de meus ancestrais recentes, sob outro ângulo (é claro), e propagar:

- Está tudo perdido! A juventude está perdida!

De todo modo, ouso permanecer enfrentando a Geração Samba-Rock, do: "Consumo, logo existo". É uma luta inglória, a derrota é certa. Fui encontrar refúgio apenas em dois, três amigos, com as mesmíssimas características. Todos buscando sentido no existir, vangloriando-se das chatices que o conhecimento trouxe, afastando-aproximando-repudiando a imbecilidade mundana e nos tornando imbecis por excelência.

Entendeu? Não é pra entender!

Não sei se peço pra cagar e saio; ou compro um bogobol.

2 comentários:

Reinaldo disse...

Muito boa a reflexão, companheiro.

Ainda me pergunto: onde vamos parar?!

Fernando Alcolea disse...

É por essas e outras que sou um cara cansado...

Segue meu amigo, segue!